Tela de Coubert
Mal o dia amanheceu e o sol surgiu no horizonte transformando os campos e rios em ouro líquido,a aldeia despertou para mais um dia de labuta,na seara.
Pedro e sua mulher,em silencio, bebiam leite fresco e comiam queijo e pão,sua refeição matutina.
_E os rapazes? Pedro perguntou.
A mulher deu de ombros,constrangida.
_Ainda não acordaram.
Pedro suspirou e saiu pro eito.
Aqueles filhos, três rapazes,tinham lhe saído pior que a encomenda.Não estudavam,nem trabalhavam.Rapazes fortes,braços vigorosos,podiam estar ajudando na colheita ,e,no entanto,passavam o dia ser fazer nada.Uma vergonha para a família,de gente trabalhadora,que há três gerações cultivava a terra.
Por certo ,os vizinhos murmuravam;não se passava nada naquele lugar que não se soubesse.A vida da roça arredonda a barriga e estreita o cérebro,já disse alguém.E a fofoca corre solta.
-Mas, hoje dou um jeito nisto !Resmungou o ancião.
À noite,após o jantar,reuniu os filhos no alpendre,enquanto uma lua redonda e branca passeava no céu.
-Meninos,o tempo passa e vou ficando mais velho e cansado.Vocês são homens e fortes.
Nunca freqüentaram escola –me digam! –como pretendem se manter ,velar por sua mãe,se for preciso,ou sustentar família,quando as tiver?
_Amanhã iremos trabalhar.Mas,não aqui.Decidimos ganhar o mundo,vencer na vida e voltaremos aqui,depois de três anos.
Ao alvorecer do dia após essa conversa ,os três levantaram assim que a aurora,com seus dedinhos cor de rosa,abria as cortinas do mundo.
A mãe cozinhou um panelaço de arroz e charque,todos comeram juntos,e preparou as sobras em três vasilhas iguais,que deu aos rapazes para que levassem,á guisa de farnel.
O filho mais velho,comeu um pouco do arroz e ganhou a estrada;quando o segundo despertou,meio estremunhado,apanhou uma côdea de pão e apressou-se a sair,mastigando o alimento.O terceiro acordou com o sol alto.
Espreguiçou-se,devagar,e exclamou:
-Os outros já foram; melhor,ir também.Recusou o arroz;apanhou duas maçãs e saiu comendo.
Adiante,enquanto andava preguiçoso,olhando o mundo,topou com um grupo que cantava alto e tocava tambores;era uma companhia de teatro mambembe que voltava de uma apresentação na aldeia vizinha e seguia rumo ao sul.
Um dos atores perguntou-lhe:
-Que estás esperando ai,parado,feito um dois de paus?
-Nada,só olhando.Acho que gostaria de ser artista.
-Quer ir com a gente?Ensinaremos você a ser palhaço.
Deu certo como artista. Tinha bela voz e dedilhava a guitarra,com sentimento.
Três anos se passaram.Ao lembrar do combinado,cheio de saudades de casa e curioso para rever os irmãos,apanhou a guitarra e tomou o rumo de casa.
Mas,encontrou pela frente um imenso mar revolto e não pode atravessar.
Louco de saudade, ao ver que não podia atravessar,resolveu suicidar-se.Não sem antes tocar uma bela música e cantar uma canção que falasse de saudades.
Chorando,entrou nas águas revoltas e foi levado pelas ondas.
Meio desacordado, ouviu uma voz humana,que lhe disse,após tomá-lo nos braços:
-O bom vento,nosso amigo,levou tua canção até o meu rei e ele quer que cantes,no seu palácio.
O rapaz acompanhou o mensageiro;foi levado à presença do rei.
Sentado num trono de ouro,Drago,o rei assim falou:
-Tens uma voz maviosa!Quero que sejas nosso jogral.Mas,antes,come e bebe um bom vinho;deves estar cansado.
Bem tratado e alimentado,o jovem não se sentia feliz;lembrava constantemente de sua mãe e sua casa;queria voltar.
-Não és feliz aqui?Perguntou o rei,um ar de preocupação no rosto.
-Claro que sim ;mas,fico triste quando penso na minha mãe.
-O rei cofiou a barba e respondeu:
-Compreendo .Amanhã poderás voltar.Meus conselheiros vão querer te dar ouro e prata;não aceites.
Pede-lhes uma pedra preciosa igual a esta que trago ao peito.Quando necessitares de alguma coisa,basta pedir à pedra.Terás o que quiseres.
Assim foi feito. No dia seguinte o rapaz partiu,a pedra ,numa corrente de ouro,presa ao seu peito.
Que alegria ao reencontrar os irmãos.A mãe tinha chorado tanto pelos filhos que perdera parte da visão.O pai tinha envelhecido muito,mas,ainda pode ter o prazer de os rever. .
Houve um lauto jantar,regado a um bom vinho caseiro e,então,o pai perguntou-:
-Você,meu filho mais velho,que profissão aprendeu?
-Meu pai,sou ferreiro.
-E,você,meu filho do meio?
-Sou prateiro,pai.
-E,qual a tua profissão,meu filho caçula?
-Sou artista, pai.
O velho,ao saber que tinha um filho artista,morreu de vergonha e pesar.
O tempo foi passando,os rapazes casaram,tiveram filhos,e,um dia a esposa do mais velho disse à esposa do mais moço:
-Olha,só,nosso cunhado.Nada faz durante o dia e não ganha um tostão.
Depois que meu marido,morrendo de raiva,queimou sua guitarra,passa o dia cantarolando,debaixo das árvores e o barulho da sua música,acorda nossos filhos.
Melhor repartir a herança ou nosso cunhado vai comer e beber todo nosso quinhão.
O músico ouviu a conversa e ,no dia seguinte,apanhou umas varas compridas,palha , um grande caldeirão e dois pratos quebrados,chamou sua mulher,e,num terreno baldio,construiu sua casa.
Todos os dias ia até a montanha e ,assim,puderam viver algum tempo em paz.Até que chegou o inverno e,com ele,a chuva e os ventos.
O rapaz não pode voltar à montanha,onde caçava,apanhava lenha e trazia frutas para casa.
No fogo baixo,o caldeirão fervia água.Era só o que tinham para se aquecer.
De repente,fez-se a luz;o rapaz lembrou da “pedra do desejo” que o rei tinha lhe dado.
Correu a gritar pela esposa ,que estava deitada,transida de frio.
-Levanta,mulher!Que queres comer?Peixe,carne assada,beber vinho? Escolha!
Esse homem endoidou de vez,pensou a esposa;e,nem se mexeu.
_Anda,mulher!Fala o que queres.
-Deixa-te de doidices,poxa;não estou para brincadeiras tolas.Se ao menos tivéssemos um pouco de arroz! suspirou.
O homem não se deu por vencido.
Agarrou a pedra e pediu:
Pedra querida,desejamos uma tigela grande de arroz e uma porção de carne e peixe.
Apareceu um duende que acendeu o fogão e altas labaredas aqueceu a palhoça.No chão,sobre um tapete,foi colocada a refeição:caldo,peixe e carne.
Espero que goste, pobre diabo.Resmungou o duende,um sujeitinho mal humorado.
O homem despertou a mulher e ambos comeram até fartar.
Onde arranjaste dinheiro para comprar tudo isto!? Ela perguntou.
Piscando o olho,o homem tirou a pedra do pescoço e riu:
_Não comprei.Tudo o que eu desejar,basta pedir à essa pedra que me foi dada por um grande rei.
A mulher arregalou os olhos de cobiça e disse:
-Se possuis tanto tesouro,porque não fazes uma casa decente prá gente morar?Queres que o vento forte derrube ,de vez,essa cabana de palha?
Então, o homem pediu uma bela casa e foi atendido.
Ao sair,o duende resmungou:
-Tira bastante proveito dela,pobre diabo.
O homem não revidou,pois,estava ocupado a admirar seu belo jardim,seus móveis caros e sua mulher bem vestida e alimentada.Percebeu o quanto ela era bonita.
Um dia,seu irmão mais velho teve que ir à aldeia e encontrou,na estrada,seu irmão caçula,montado num belo cavalo branco,bem ajaezado,vestido como um príncipe;na garupa,uma bela mulher,ricamente vestida.
O mais velho contou ao mais moço e os dois e suas mulheres alvoroçadas foram até à casa do caçula,tirar pergunta.
Começaram os insultos.
_Ladrão!Vilão! Malvado!Seus irmãos se esgoelando prá viver e tu no bem – bom,à custa de roubos e mal – feitos.
_Oba,vê como falas.Não roubei nada.Apenas,faço uso de um presente que recebi de um grande rei.
Assim,construí essa bela casa,que os raios de sol iluminam e,cujas flores do jardim,enchem de perfume a minha vida.Basta pedir o que eu quero,que terei.
-Verdade!? Podias ser um bom irmão e nos emprestá-la,por uns dois dias.
O bondoso jovem não negaceou.
Dividiu a pedra ao meio e passou o pedaço ao mais velho.
Mal chegou em casa,o ganancioso ferreiro,apanhou a pedra e pediu:
-Pedra,pedra,quero muito ouro.
Na mesma hora,o duende chegou com uma cornucópia entupida de ouro.
-Pobre diabo,resmungou;espero que faças bom proveito.
O mais velho se irritou e respondeu:
-Por que me tratas assim,escravo!?Possuo terras,tenho bastante para comer e animais de corte.Se me chamares assim,da próxima vez,apanhas.
Mas,de repente uma rajada de vento varreu a casa e a destruiu,levando ainda e espalhando pelo campo,todo o dinheiro recebido.
A metade da pedra voou pela janela.
O mais moço almoçava com a esposa quando viu entrar a metade da pedra e,depois de traçar alguns círculos,juntar-se à outra metade que estava no seu bolso.
A cornucópia abarrotada de moedas apareceu misteriosamente no chão atapetado.
Quanto á pedra,saiu voando e afundou no mar.
*Conto de Miriam Sales
ESCULTURAS FEITAS COM LIVROS
Fantástico trabalho de Brian Dettmer
Obrigada pela visita
Bjs da Miriam